domingo, 27 de maio de 2012

Todos os Sonhos do Mundo

A escrita me encanta! É a tradução do sentir de alguém perpetuado ao ponto de o tempo não se fazer sentir quando outra pessoa anos à frente se vê refletida nas palavras de alguém que não teve nunca acesso às janelas da sua alma.  Fernando Pessoa em tabacaria perpetuou o que tenho latente em mim desde que conheci a União da Juventude Socialista :

"Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo."


Este foi um fim de semana emblemático para o meu sentir: fotos para o convite da formatura do meu curso de Direito e congresso da UJS Pernambuco na data que marca os 10 anos de morte de João Amazonas, principal dirigente comunista brasileiro da terceira geração. 

No plano pessoal traço poucos propósitos "nada de coisas impossíveis para que a vida possa ser bem vivida", e por tal postura encaro quase que diariamente o temor de meus pais de que eu acabe por "não ser alguém na vida". E é inevitável no último ano de curso, me pegar frequentemente me questionando o que será daqui pra frente, engolida por aquela incerteza dos horizontes que se vislumbra, mas nao se pode tocar (não ainda). 

Durante o grupo de discussão sobre a Guerrilha do Araguaia que teve em João Amazonas um de seus emblemáticos heróis, recebo mensagem de texto de uma grande amiga e recém filiada " Me encontrei. UJS, esse é o meu lugar". O sms foi escrito enquanto ela ouvia o relato de Alanir Cardoso, presidente do PCdoB-PE, sobre a sua trajetória de lutas e dias amargos de clandestinidade e tortura. Durante as suas sete décadas de militância política, João Amazonas carregou sobre os seus ombros os sonhos do mundo. Estes mesmos sonhos deram forças à Alanir para aguentar 72 dias ininterruptos de tortura.

Tabacaria foi escrito em 1928, e agora no ano de 2012, preparando um projeto de mestrado que tem como centro A Guerrilha do Araguaia e vendo nos olhos a emoção de quem ouviu as palavras de Alanir Cardoso, eu descubro finalmente, o que significa ter em si "todos os sonhos do mundo". E vejo neles a beleza e poesia que faltavam às janelas de Fernando Pessoa.



sexta-feira, 11 de maio de 2012

Da retomada - Entre encontros e despedidas

O cotidiano agitado tem nos últimos tempos abafado os sentidos que latejam em mim e por hora padeço de saudade de olhar o mundo com a intensidade de quem deseja saber mais do que os seus vinte e poucos anos. Na última semana de março me decretei férias, e é incrível como sete dias foram capazes de reconfigurar as engrenagens adormecidas da minha alma.

A capital paraibana retomou o frio na barriga de se expor ao julgamento de quem é referência naquilo que se julga importante, o êxtase do caminho novo que desponta no horizonte, e aquela sensação tão peculiar de que há sentimentos e pessoas que o tempo e a distância não conseguem modificar. Rever e ser recebida pelo amigo de tanto tempo, Décio Raniere, e perceber que apesar de tantas mudanças, minhas e dele, o conforto de estar junto se mantém vivo reafirma a doçura que pode e deve ter a vida, resumida na constatação de fim de noite: " Sinto sua falta". Eu sempre vou sentir.

O Rio Grande do Norte por sua vez emoldurou com belezas explêndidas cada nuance de minhas intensidades. A satisfação e a calma de ter meses de paciente espera aplacados em dias de memórias infinitas, a celebração das coincidências da vida que permitiram conhecer amigos de luta em um café da manhã não planejado, a tão distante sensação de paz nos muros do Forte e o explorar noturno da vida de uma rua deslocada das redondezas. 

No caminho de volta, pela janela do carro havia a percepção de ter apreendido e guardado em cada canto de memória a doçura dos dias vividos em cheiros, cores e sabores tão diversos. Em tempos de cotidiano sem significado, me redescobrir capaz de sentir como antes foi de fato, transitar entre dois lados. Dois lados de mim mesma : o que cria raízes e estabelece meus limites, e esse outro tão novo e desconhecido, que trocaria grandes parcelas de segurança pelo reviver de um amanhecer adocicado.