domingo, 18 de novembro de 2012

Palpite





Daqui de baixo eu olho você no seu palco a meia luz. Você e seu primeiro amor. Você e esse balanço ritmado dos seus pés contra o chão de madeira. Você e esse meio-sorriso de quem acha que dali, tem o controle das batidas do próprio coração.
Ao fim da noite você vai dizer que as coisas lá de cima parecem mais interessantes, e eu já tenho decorado esse discurso - os vermelhos dos vestidos que passam, os olhares de soslaio despejados aqui e acolá, a atenção maravilhada da jovenzinha no canto da porta. Seu olhar de artista só esqueceu de captar as entrelinhas de tudo isso. 
O palco é a visão, o chão é o tato. Você enxerga, eu sinto. Daqui de baixo eu ouvi os sotaques se misturarem no sofá à direita e as emoções da moça saltarem tão rubras quanto a cor da sua roupa, pra ganharem forma no "eu te amo" dito ao pé do ouvido. Nessa hora eu olhei pra você, e eu que te conheço de todos os ritmos, vi a lágrima de despedida rolando a meia luz, e o teu passo cadenciado marcando agora as batidas do meu coração em despedida. 

quarta-feira, 7 de novembro de 2012

Constatação n° 2 - De ser Sólida e um Tanto Só.

Agora que passou eu me ponho a rir da simplicidade de tudo isso. Meses de uma angústia inquieta pela única razão de não conseguir encontrar a mim mesma em meio ao turbilhão de celulares que tocam e ordens que me gritam aleatoriamente. Tudo isto para no fim, em único dia de pleno descanso, lendo aqueles livros água-com-açúcar que tanto me agradam, perceber incrédula que a única razão de meu desencontro é a mudança que se solidificou em mim. Sei que parece bobo, mas essa constatação de que não sou mais eu mesma me deixou com aquela expressão embasbacada de quem houve o inesperado.

É que eu sempre fui tão sólida. E sempre um tanto só. E estes vastos momentos de solidão me permitiram conhecer a mim mesma de maneira muito segura. Perceber-me outra me tira os pés do chão. Eis que agora não prevejo as minhas atitudes, e me surpreendo todas as vezes que não consigo segurar as emoções que não cabem em mim e o choro vem sem aviso e permissão - assim sem pudor, assim sem medo. E dias atrás ao perceber que os rancores - vizinhos tão antigos do meu coração - agora se dissipam tão logo o dia acaba, me fez enxergar outra pessoa além do espelho. Acho que tenho medo, e um certo vazio de me ter abandonado assim.

É diferente olhar o caminho já incerto quando outras pernas parecem te guiar. Um esforço novo e solitário pela frente - traçar os limites de quem agora sou. E sabe aqueles medos bobos de outrora? Tenho medo de surpreender a mim e aos que me cercam, de tal maneira que um estranhamento mútuo se instale, e eu acabe me acostumando a ter os pés fora do chão. Quem disse que voar não tem a sua parcela de dor?


Que as mãos invisíveis do tempo afastem os nuncas que me batem à porta e eu possa voltar a caminhar com segurança para a minha varanda, com o chá dentro da caneca se misturando num balanço já conhecido.